sexta-feira, 6 de março de 2020

Uma montadora de automóveis em Brejo Santo; por Paulo Gondim

Paulo Gondim

Confira o texto dessa semana do escritor Paulo Gondim.

Notícia boa! Uma montadora de automóveis em Brejo Santo. Pode parecer estranho, mas aconteceu. Início dos anos sessenta, Brejo Santo se resumia ao comércio, entre a praça e a Rua Padre Viana, a do Banco do Brasil, que era um açougue, com a cadeia na outra esquina, um casarão com uma área de arquitetura diferente para a época. Depois da rua padre Viana, já eram as roças de algodão. 

O bairro do Juá, hoje São Francisco, ainda não tinha o quartel da PM, e contava apenas com três ruas: Santa Terezinha, do Juá e uma meia dúzia de casas da Rua Genézio Ricarte, nome dado, porque nela morava Seu Genézio, comerciante antigo de Brejo Santo. Foi dono do primeiro caminhão alfa Romeu, câmbio seco, que precisava de muita força para girar o volante trocar as marchas. As duas ruas, Santa Terezinha e do Juá, contavam apenas com duas travessas, Intendente Lourenço Gomes e Joaquim Lucena, a do Clube de Mães. Lá havia o armazém de Zé Sabino e eu morava nessa rua. 

O comércio, com algumas lojas de Tecido, a Farmácia Santana e de Seu Antoio Braz, a sapatariasde Pedro, João e Nane Basílio e casa de peças com bomba de gasolinaa de Neco Jacinto, vizinha do bar Iracema. No quarteirão seguinte, a Oficina se conserto e aluguel de bicicletas de Mundinho. O restante, algumas bodegas, cafés, bancas de jogos de dados e roletas; a feira era somente aos sábados. Muitos meninos engraxates e alguns vendendo pirulitos, naquela tabuleta furadinha. 

Ainda não havia luz elétrica. Brinquedo, só menino rico é que tinha. Eu como era largado mesmo, inventava os meus. Copiava os brinquedos que alguns retirantes passavam pela cidade, vendendo carrinhos, Candeeiros, funis, canecos, ralos e aviõezinhos de lata, que giravam presos a um cordão e faziam um barulhinho gostoso. Nunca pude comprar um bicho daqueles... Resolvi fazer uns pra vender, quase tomei uma surra de minha mãe. Disse ela que era coisa de flagelado... que horror.... desisti do empreendimento... Minha mãe reervara sonhos mais altos pra mim! 

O negócio foi construir carrinhos mesmo. Fazia a boleia com uma lata de óleo, que o pessoal botava nos caminhões e a carroceria de madeira, normalmente de tábuas de caixão de sabão, que vinha em barras de 30 ou 40 centímetros e sempre eram vendidas fatiadas. Pouca gente comprava uma barra inteira. As molas? Sim, tinha feixe de molas! Eram feitas com as chamadas “aspas” de metal. Eram alças metálicas que se usavam para amarrar embalagens e fardos mais pesados. Foram substituídas por fitas plásticas. 

As rodas de madeira não fiavam totalmente redondas, mas quebravam um galho e lá, o carrinho pronto, saído da linha de montagem, ia à venda! Tínhamos uma equipe de produção. Tiquinho de Severino soleiro se encarregava de arranjar a “matéria prima”, tabuas, pregos, “aspas” e latas vazias de óleo de Caminhão. Eu construía os carrinhos e Zé Marcelo era o “diretor de marketing”, vendia o produto. Carrinho pronto, Zé Marcelo que ficava de plantão, para testar o veículo e ir vender, dava a primeira volta, reproduzindo o som do barulho de um motor, “Rum, Rumm, Rummmm” e disparava pelas calçadas da Rua do Juá e sumia... 

Nunca sei por onde diabo ele andou tanto... Mais uma meia hora depois e chegava com o dinheiro. Era uma festa!!! Corríamos para a bodega de Pedro Marcelino ou de Zé Teles para comprar “pão aguado” (quem lembra?) e doces em barras coloridas, feitos por Seu Firmino, morador da Rua do Juá, onde hoje é a Casa de Maria de Zé Frutuoso, já falecidos. Foi assim a primeira montadora de automóveis de Brejo Santo, empreendimento que, ressalvada as devidas proporções, foi de muita importância. Zé Marcelo se tornou comerciante, Tiquim, se não me engano, é técnico agrícola e eu... Bom, meu pai queria que eu fosse doutor, mas acabei contador de “estórias”.


Por: Paulo Gondim

Nordestino, do sertão da Paraíba, viveu em Brejo Santo, no Ceará, onde foi um dos fundadores do Sindicato dos Trabalhadores Rurais.

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