segunda-feira, 8 de março de 2021

Demanda por oxigênio em cilindros cresce até 2.000% no Ceará e empresas temem desabastecimento

Foto: Reprodução/SVM

Diante do crescimento exponencial na ocupação de Unidades de Terapia Intensiva (UTIs) em decorrência do avanço do coronavírus no Estado, as distribuidoras de oxigênio medicinal, que é utilizado no tratamento da doença, temem um colapso - sobretudo nos municípios do Interior do Estado - nos próximos dias, período que coincide justamente com a estimativa para o pico de casos no Ceará (12 a 22 de março). Empresas relatam que a busca pelo produto saltou até 2.000% na comparação entre fevereiro e março.


É o caso a A&G Gases. Em nota enviada ao Sistema Verdes Mares, a empresa pontuou que a demanda segue crescendo com o passar dos dias. "A demanda cresceu aproximadamente 2.000%. Órgãos que consumiam 300 metros cúbicos de oxigênio semanal, hoje estão com um consumo de 5.600 metros cúbicos semanais, o que vem crescendo constantemente", explica o texto.


De acordo com a empresa distribuidora, o problema da alta demanda em decorrência da expansão da doença é agravado pelo fechamento de algumas empresas de produção e distribuição de oxigênio do Ceará. "A dificuldade de abastecimento de oxigênio vem sendo percebida pela empresa desde o final de novembro, quando ocorreu o fechamento de algumas empresas responsáveis, direta ou indiretamente, pela produção e a distribuição de oxigênio do estado do Ceará".


A nota cita que um dos negócios mais atuantes do setor no Estado foi um dos que teve as atividades encerradas e "atendia cerca de 75% da demanda de cilindros de oxigênio do mercado cearense, vendendo para órgãos públicos e revendedores que atendem órgãos de saúde não só no Estado, mas também no Piauí e no Maranhão".


O fechamento ocorreu a partir da Operação Oxida, do Ministério Público do Ceará (MPCE), deflagrada no fim de novembro do ano passado. A operação teve como objetivo combater o fornecimento de oxigênio adulterado para pacientes, clínicas e hospitais públicos de quase 20 municípios em todo o Ceará. À época, onze mandados de busca e apreensão foram expedidos.


"Após o fechamento dessas empresas, ficamos na dependência de duas multinacionais, sendo que uma delas cortou o nosso fornecimento sem motivos e explicações aparentes, e a outra continuou a nos atender, mas de forma precária. A chegada da segunda onda de covid-19 agrava o quadro de desabastecimento", detalha a nota da A&G Gases.


Obstáculos de logística


Infelizmente, recorrer a outros estados também não é uma alternativa cogitada pela distribuidora, já que, de acordo com a A&G, isso compromete a logística da empresa. "Em média, perde-se uma semana somente no deslocamento dos cilindros para o local de envase do oxigênio medicinal. Além disso, não temos estoque de cilindros o suficiente para o retorno imediato do oxigênio", frisa a nota.


A A&G Gases atende unidades de saúde em 14 municípios cearenses, sendo boa parte na região do Maciço de Baturité. Segundo a empresa, cerca de 90% dos municípios cearenses consomem o oxigênio em cilindros, o que exige a atuação de outras empresas para envasar o insumo e fornecer às unidades da rede pública municipal.


A empresa à qual se refere a A&G Gases na nota é a multinacional White Martins. Procurada pela reportagem, a White informou que mantém o fornecimento de oxigênio líquido aos seus clientes das redes de saúde pública e privada no Ceará, conforme estabelecido em contrato.


A White Martins possui uma fábrica em Pecém com capacidade nominal de produzir até 180 mil metros cúbicos de oxigênio por dia e atualmente possui um estoque de cerca de 4 milhões de metros cúbicos de produto. Durante o recente colapso do coronavírus em Manaus, a empresa enviou parte da produção ao Norte do País para tentar conter a onda de mortes provocada pela doença.


"A companhia tem informado aos seus clientes e às autoridades de saúde locais sobre variações de consumo de oxigênio. Nestas oportunidades, a empresa solicitou que sejam comunicadas formalmente e em tempo hábil as necessidades de acréscimo no fornecimento do produto bem como a previsão da demanda, de modo que a empresa possa ajustar a logística de fornecimento por conta da necessidade de mais veículos na operação", diz a nota da White Martins.


Ainda conforme a fornecedora de oxigênio líquido, as autoridades "são responsáveis pela gestão da saúde e têm acesso a dados que compõem o panorama epidemiológico da covid-19, como o índice e a velocidade de contágio da doença, o crescimento da taxa de ocupação de leitos, a abertura de novos leitos, a implantação de hospitais de campanha, a quantidade de pacientes atendidos, bem como a classificação dos casos".


"A White Martins – como qualquer fornecedora deste insumo – não tem condições de fazer qualquer prognóstico acerca da evolução abrupta ou exponencial da demanda", arremata a nota.


'Consumo cinco vezes maior'


Os problemas relatados pela A&G convergem com os relatos da distribuidora C A Lima. De acordo com Fabiana Lima, que administra o negócio, houve um avanço significativo da demanda nos últimos 15 dias: antes do novo avanço da pandemia, a empresa distribuía cerca de 100 cilindros/dia. Hoje, são cerca de 200 cilindros/dia circulando.


"Mas em todas as rotas que eu tenho, se tivesse local para encher esses cilindros, talvez eu rodasse 400/dia, porque a demanda está alta, tanto que abri mão de alguns hospitais para os quais eu distribuía. Muitas empresas distribuidoras também não estão conseguindo atender e isso é reflexo da demanda", diz Fabiana.


Ela também cita o encerramento das atividades de empresas do ramo no fim do ano passado como um agravante. "Nós estamos sentindo uma pressão maior, porque antes nós tínhamos mais alternativas", pontua Fabiana.


"E a White Martins não quer nos vender. Temos uma outra fornecedora, a Messer, e uma empresa em Recife, mas buscar em Recife é viável em um cenário normal, mas diante dessa situação, distância e tempo são os nossos inimigos", lamenta Fabiana Lima.


"A nossa grande dificuldade é que nós não temos onde encher os cilindros, então nós gostaríamos que a White Martins nos desse uma solução. Nós estamos nos mobilizando para que não ocorra o que aconteceu em Manaus", alerta a administradora da C A Lima.


Procurada novamente, a White Martins reforçou que mantém normalmente o fornecimento de oxigênio líquido aos seus clientes das redes de saúde pública e privada no Ceará, conforme estabelecido em contrato.


A C A Lima atende em 33 hospitais em todo o Ceará, com destaque para a região jaguaribana. "Nós distribuímos Itaitinga, Pacajus, Chorozinho, Trairi, Pentecoste, Jijoca", diz Fabiana.


Reunião


De acordo com Fabiana, uma reunião entre as empresas distribuidoras de oxigênio em cilindros e representantes do Governo do Ceará, além de prefeitos, está marcada para amanhã, às 14h. O objetivo, conforme ela, é justamente discutir o abastecimento do produto no Estado.


Em nota, a Secretaria da Saúde do Ceará (Sesa) informou que "estabeleceu um planejamento de suprimento de oxigênio hospitalar e emitiu comunicado oficial para as empresas fornecedoras do insumo garantindo o fornecimento do gás para todas as unidades da rede Sesa, quer seja na Região de Fortaleza ou nas outras quatro regiões de Saúde do Ceará".


A Pasta destacou que o suprimento de oxigênio tem como base de cálculo "números cinco vezes maiores que a demanda máxima do pico da pandemia de covid-19 do ano passado, considerando manutenção do abastecimento por 90 dias" e convocou os prefeitos e demais gestores municipais e da Rede Sesa a fazerem o mesmo planejamento, garantindo o abastecimento das unidades.


A Sesa informou que se dispõe a orientar sobre o planejamento "ou em situações emergenciais como tem feito até hoje, assim como a colaborar com empréstimos, transferências de pacientes e ajustes na condução terapêutica para garantir o completo e adequado tratamento de toda a população cearense".


Fonte: Diário do Nordeste

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