sexta-feira, 13 de março de 2020

O Parque Lima em Brejo Santo; por Paulo Gondim

Escritor Paulo Gondim

Brejo Santo mais adiantada, já atraía muita gente ao comércio e a outros serviços, o que a tornou pólo regional do Sul do Ceará, parte da Paraíba e Pernambuco. Com esse olhar, a cidade começou a receber os primeiros circos e parques de diversões mais avançados. Já tinha roda gigante e serviço de som, com gerador próprio de energia elétrica. 


Me lembro de um circo que não tinha lona. Outros já eram melhores e me lembro de um que ficou apenas quatro dias para não repetir espetáculo. Já era um avanço. Mas um parque de diversões que marcou época na cidade foi o Parque Lima. Esse se instalava sempre ali na Praça, perto da BR. A praça ainda era na sua configuração original, apenas com seus passeios ladrilhados de "mosaicos casco de burro". Eram assim chamados, porque em cada um dos quatros cantos, havia um desenho em forma de gota, que lembrava também o rastro da pata de um burro.

A junção de quatro peças desses ladrilhos, formavam uma espécie de um trevo de quatro folhas. Instalado sempre ali, na praça, com muitas atrações, foi o único a trazer o famoso carrossel de cavalinhos, os quais se movimentavam, simulando um "galope" e com acabamento bem elaborado. Uma roda gigante alta e colorida, toda iluminada, cujas hastes de sustentação das cadeiras, formavam uma estrela. O serviço de som era uma tração à parte. Muito bom! Uma discoteca variada e um locutor de voz bonita, fazia a animação e atendia os pedidos de músicas. 

Foi esse parque que trouxe, em primeira mão, a música Enigma, na voz de Nelson Gonçalves. Tocava demais, até porque é mito bonita e é uma de minhas preferidas, pela letra inteligente e a melodia espetacular, puxada inicialmente, por um solo rasgado de trombone. Essa música me deixou boas lembranças. Completando o ambiente festivo, havia as barracas de Maçã do amor, pipoca, sorvetes, pescarias e tiro ao alvo. Como sempre, a tal da divisão social se mostra nessas coisas também. Tudo aquilo, um verdadeiro castelo de sonhos, luzes, música, cores, divertimento, era para quem tinha dinheiro. 

Nossa turma da rua do juá, não dava muito valor a essas coisas, por razões óbvias e se limitava a dar alguma volta por lá, e sair pra coisas mais práticas. Nossas brincadeiras que eram de graça e na raça. Mas havia um pessoal de mais idade que ficava na chamada fila do contrapeso da roda gigante. Mimi de Neco Ambrósio é quem me contou isso. 

A roda gigante não podia rodar com cadeiras vazias em sequência. Foi uma das coisas que também me intrigou. Um casal sentava-se numa cadeira e a roda girava até o ponto mais alto, para poder preencher outra cadeira. Sempre assim, nessa relação. Aí, quando o movimento diminuía, era a vez da turma da fila do contrapeso, aquele pessoal que ficava na grade, olhando pra cima com olhos pidões. 

Esses esperançosos eram convidados a ocupar as outras cadeiras, para a roda funcionar com o equilíbrio de peso necessário. Outra amiga, que ficava nessa fila, achava que o operador da roda tinha pena delas e as deixava andar de graça. Essa fila também ocorria no carrossel de cavalinhos. Essa amiga me disse que ficava ali, toda arrumadinha, limpinha, esperando a vez. Era tiro e queda! 

Quando um pai não queria subir no carrossel com uma criança, dizendo que ficava tonto ou porque era gordinho, o operador chamava: "Vem cá, galeguinha, segura essa criança no colo pra rodar no cavalinho"! Além da rodada de graça, ainda era recompensada com um sorvete ou uma pipoca que ganhava da alma generosa! (Mas me confessou que o sonho dela era comer a maçã do amor). 

Ainda no Parque, havia sorteio de ingressos o que de certa forma, agitava e prendia a atenção do pessoal que não podia pagar. O Parque Lima era responsável por trazer sempre novidade musical e a cada ano inovava mais nos brinquedos. Foi o primeiro a trazer aquele carrossel chamado "chapéu mexicano", muito violento e perigoso. Nunca gostei nem de ver aquela estrovenga. 

Meu forte mesmo eram as músicas. Essas eram de graça e eu ficava a uma certa distância e ouvia com atenção. Me lembro de duas que me marcaram muito, pela sua criatividade e diferença do velho contexto de letras sofisticadas. Menino sempre procura entender algumas coisas, fazendo comparações. Era Jorge Ben, com "bicho do mato" e "Chove Chuva". Ficava pensando como alguém faria uma música falando de "Bicho do Mato, bicho bonito danado" e me questionava que diabo de bicho seira esse? 

A música Chove Chuva por razões óbvias. Definitivamente, O nordeste não é região de chuva, e vem um sujeito cantando: "Chove chuva, Chove sem parar"... Justo no mês de julho, que não cai um pingo de chuva no Ceará? Certo é que quando esse parque chegava à cidade, era sinal de música boa e bom divertimento. Deixou muita lembrança boa em muita gente. Até no pessoal da fila do contrapeso da roda gigante, não é Mimi?

Paulo Gondim

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